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terça-feira, 2 de março de 2010

@ Quadrado

Saindo do quadrado do debate sobre qualidade da educação

Por Helena Singer (*)

Desde que conquistamos a universalização do ensino básico no Brasil, o debate na área de educação tem se voltado para a questão da qualidade. Copiando um modelo norte-americano, as políticas implementadas em busca desta qualidade apoiam-se no seguinte quadrado:

1. Avaliações episódicas, tipo provas teste de conteúdo aplicadas aos estudantes, que compõem indicadores de desempenho;

2. Criação de índices de desenvolvimento da educação compostos por estes indicadores de desempenho e outros de fluxo escolar (aprovação);

3. Definição de metas para cada escola a partir destes índices;

4. Bonificação por desempenho ou mérito dos servidores de escolas que superam as metas estabelecidas pelas secretarias de educação e/ou por desempenho dos próprios professores em provas teste.

Pena que esta ideia já tenha chegado por aqui velha. No estado de São Paulo este projeto consolidou-se em 2007. Ela compõe uma forma já ultrapassada de entender gestão pública pela ótica da gestão privada, o que coloca os usuários dos serviços públicos como clientes e seus dirigentes como executivos e se orienta pela eficiência de resultados medida por instrumentos supostamente objetivos.

No caso da educação, os testes de português e matemática seriam as tais avaliações objetivas do aprendizado dos alunos. Nesta lógica, garantir o aprendizado não é objetivo de estudantes, pais, e professores, apenas de gestores, os que têm visão administrativa eficiente. Mas, é claro, que sem o empenho dos professores, não há como atingir o objetivo. Então, para conseguir engajar os professores no processo, é preciso dar a eles o que eles realmente objetivam, o mesmo que supostamente querem os funcionários das empresas privadas: dinheiro. Assim, os professores, correndo atrás de dinheiro, conseguem que os alunos aprendam o português e a matemática necessários para responder aos testes, a nota final da escola melhora, os jornais dão as boas novas – nossos estudantes finalmente aprenderam a ler, escrever e contar – e a política é aprovada pela população.

Parece lógico, mas de fato é ineficiente. A qualidade da educação não é o que se tem verificado mesmo depois da implantação desta medida tanto aqui quanto nos Estados Unidos. Em ambos os países, as manchetes continuam alardeando a ignorância dos jovens nas áreas básicas do conhecimento escolar. De um lado, isto é resultado esperado de uma forma de avaliar episódica, conteúdista, homogênea e exterior à vida das pessoas. Ela presta-se sempre muito mais a denunciar a ignorância do que efetivamente reconhecer e avaliar conhecimento. Mas, já falei sobre isso em outra coluna.

É a respeito do outro lado da questão que se trata aqui. À medida que ultrapassamos a primeira década do novo século – e, sobretudo, após a crise financeira de 2008 –, ficaram evidentes os limites da lógica privada para a gestão, e uma nova forma de governar vem se fortalecendo, uma forma que ultrapassa o quadrado em que estava sendo debatida a questão. Trata-se da governança participativa (o nome que se está usando é Responsive Governance). Esta se orienta pelos princípios da transparência e da participação, busca o empoderamento dos cidadãos na sua relação com o Estado, responsabilizando-os também pela gestão pública, e avalia continuamente os processos que levam ao sucesso da política empreendida. Nesta nova forma de gerir, o objetivo é a articulação inteligente e equilibrada do conjunto dos atores interessados no desenvolvimento (os stakeholders).

No caso da educação, entende-se que é objetivo dos estudantes, pais e educadores que as escolas cumpram seu papel, qual seja o de ensinar. O sucesso da escola dependerá, portanto, da sua abertura para efetiva participação destes atores em sua gestão, desde o planejamento pedagógico até a avaliação final. Para tanto, é preciso que as escolas tenham autonomia para elaborar seu projeto pedagógico e gerir seus recursos financeiros, que os gestores e professores respondam à comunidade escolar, sendo por ela selecionados e avaliados, e que, finalmente, os estudantes tenham condições para desenvolverem interesse pelo mundo que os rodeia, iniciativa e competência para elaborarem e realizarem projetos próprios. Nesta nova perspectiva, as escolas, ao invés de competirem entre si por bonificações, passam a merecer reconhecimento quanto mais se tornem ambientes solidários e efetivamente voltados para o conhecimento.

A boa nova é que esta proposta já está chegando por aqui. Em diversas cidades do Brasil, iniciativas têm sido criadas para envolver os estudantes, educadores e pais na avaliação de suas escolas, primeiro passo para a construção de um projeto pedagógico que faça sentido para todos. Vamos acompanhar.

fonte

Helena Singer, socióloga com pós-doutorado em Educação, é diretora pedagógica da Associação Cidade Escola Aprendiz.

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