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sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

@ Entrevista *Maria do Pilar

Folha Dirigida, 17/12/2009 - Rio de Janeiro RJ

O desafio de ensinar

Entrevista com a Profa. Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva

Secretária de Educação Básica - MEC


Folha Dirigida - Em outubro, o MEC realizou mais uma edição da Prova Brasil. Quais são os principais objetivos desta avaliação?

Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva - É ter resultados que orientem melhor as políticas do ministério. Isso para nós é fundamental, porque ao fazer uma prova universalizada para todas as escolas urbanas, ela mostra onde estão os problemas mas, também, onde estão os bons projetos, as boas experiências. Ela nos ajuda a planejar as políticas públicas.

Nos últimos anos, quais foram os principais problemas identificados a partir dos resultados da Prova Brasil?

O principal problema é a dificuldade de aprendizagem. Em alguns lugares é muito alta, em outros, é menor, mas identificamos claramente que as escolas que têm resultados muito fracos são as que não conseguem garatir, à maioria dos seus alunos, o direito de aprender. Este, talvez, tenha sido o melhor resultado não só da Prova Brasil como também da criação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Ele leva em conta o resultado da Prova Brasil e os indicadores de fluxo escolar. Daí termos o índice que é de zero a 10 e, a partir deste índice, elencamos os 1.232 municípios com o pior Ideb e começamos a trabalhar prioritariamente com esses municípios. Depois do segundo Ideb, identificamos municípios que ainda não tinham alcançado a média nacional e incluímos também estes municípios nos grupos prioritários. Hoje, a partir dos resultados da Prova Brasil e consequentemente do Ideb, conseguimos focar o trabalho nos municípios e nas redes que tenham maiores dificuldades.

Como é o trabalho focado nesses municípios com maiores dificuldades? Que tipos de ações o MEC desenvolve ou orienta para melhorar o ensino?

Todos os municípios aderiram ao plano de desenvolvimento da Educação. Quando eles aderem ao plano, se comprometem a cumprir suas 28 diretrizes. A primeira diretriz é garantir o direito de aprender a todos. Garantir que todas as crianças sejam alfabetizadas até os 8 anos, priorizar a educação infantil, a gestão democrática, concurso público para professores. São diretrizes muito consensuais no país. Depois que o município adere, se compromete a fazer com que as 28 diretrizes sejam uma realidade, é elaborado um Plano de Ações Articuladas (PAR). Quando este plano é elaborado, tem-se um diagnóstico dos maiores problemas do município. E diante destes problemas, aparecem ações do Ministério da Educação, seja na área de gestão, seja na área de formação de professores, infra-estrutura ou de outros projetos pedagógicos. Assinado o PAR, nós então começamos a trabalhar com os municípios, o que pode ocorrer de três maneiras diferentes. Podemos trabalhar com assistência técnica, com repasse financeiro através de convênios ou com os dois. Estamos na fase de começar a monitorar os municípios prioritários na aplicação deste programa e na execução deste planejamento.

Este monitoramento já começou? Já existe algum diagnóstico?

O monitoramento já começou em agosto deste ano. Nós ainda não temos nem os resultados preliminares, mas as universidades já estão em campo fazendo este trabalho.

Como a senhora classificaria o ensino público da educação básica no país?

Ele está melhorando, falta ainda ser mais público. Nós precisamos torná-lo também a escola da classe média. A classe média precisa voltar para a escola pública, não só porque ela é direito de todos, mas porque, assim, ela se torna efetivamente democrática. Ela não pode ser um espaço reservado para a classe média como ela não pode ser um espaço reservado para a classe trabalhadora, dos mais pobres. Ela ainda precisa dessa convivência mais democrática. O Ideb, os índices de alfabetização, os índices de maior tempo de escolaridade do brasileiro, todos eles são animadores por mostrarem que, efetivamente, temos conseguido uma melhora tanto na qualidade quanto na quantidade.

Em quanto tempo o brasileiro pode ter acesso a uma educação em níveis de primeiro mundo?

Quando os países fizeram reformas consistentes e duradouras na educação, sempre levaram cerca de uma geração. Nós acreditamos que a partir de 2015 tenhamos resultados mais estáveis e que a partir de 2022 possamos atingir o padrão dos países europeus. Para isso, o trabalho não pode sofrer interrupção, ou seja, a cada mudança de governo começar tudo de novo. Por isso, os planos assinados com prefeitos e governadores são plurianuais. É preciso investir fortemente na educação básica como um todo e não apenas no ensino fundamental, como foi feito na década de 90. Temos investido na ampliação e qualificação da Educação Infantil e na reformulação mais profunda e mais radical do ensino médio. Temos trabalhado fortemente na formação dos professores, seja na formação inicial, seja na formação continuada, seja na carreira do professor, como no piso salarial de ingresso e também nos programas suplementares, merenda, livro didático e transporte escolar, que antes eram restritos ao ensino fundamental. Esses programas, merenda, livro didático e transporte escolar, hoje, atendem às crianças da Educação Infantil, ensinos fundamental e médio.

O baixo investimento por aluno é uma questão problemática para a melhoria da qualidade do ensino?

Sem dúvida. Na realidade, quando se olha o que se investe no Brasil hoje, as pessoas podem comparar com os países desenvolvidos e achar que, como o Brasil está investindo 4,7% do PIB, isto está bom. Não está. A dívida histórica do Brasil com a educação é muito grande. Nós temos 40 milhões de brasileiros como um público potencial de adultos para voltarem para a escola porque ainda não terminaram o ensino fundamental ou 10 milhões de adultos que ainda não sabem ler e escrever ou 4 milhões de jovens entre 15 e 17 anos que deveriam estar no ensino médio e freqüentam o ensino fundamental. Essa dívida educacional é muito grande, ela precisa de muito investimento, de soluções muito ousadas. Por isso o governo conseguiu a aprovação por unanimidade no Congresso Nacional do fim da incidência da Desvinculação das Receitas da União (DRU) sobre o orçamento da Educação, que vai liberar para o MEC, no mínimo, mais R$9 milhões por ano. E o governo tem aumentado sensivelmente o investimento em educação. O orçamento do MEC passa de R$24,25 milhões em 2003 para fechar, agora, com R$49 bilhões. O orçamento tem crescido sensivelmente, mas ele precisa crescer mais para que a gente possa resolver todas estas demandas geradas ao longo de, no mínimo, dois séculos de nossa priorização para a educação para poucos no Brasil.

A falta de controle social do gasto com a educação também é um problema?

Isso sempre será um problema. Se você tem um dinheiro e usa ele mal, é a mesma coisa que não ter. Você pode reparar na sua casa, na sua empresa ou na área pública. É importante que a gestão seja comprometida com o nosso objetivo principal, que é garantir a aprendizagem para todos, o que, no Brasil, significa mais de 52 milhões de alunos da educação básica. Para isso, o ministério trabalha com mais investimento em planejamento, em tempo, em gestão na qualificação de secretários municipais de educação, para que tenham um domínio sobre o financiamento público, sobre o que pode e o que não pode ser feito com recursos da educação. Os artigos 70 e 71 da LDB são muito claros em relação ao que é considerado manutenção e desenvolvimento do ensino. É importante também investir na formação dos gestores dos recursos da educação. Não adianta dizer "não vale a pena aumentar o recurso porque ele é mal utilizado". Isso não é uma regra. A má utilização é uma exceção. Queremos é que existam mais recursos e que eles sejam geridos de maneira mais eficiente e comprometida.

Que papel tem a qualificação dos professores na melhoria da qualidade do ensino?

Tem um papel chave. O professor é o profissional estratégico para as mudanças de educação darem certo e para isso ele tem que ter direito a formação inicial e continuada, sempre de qualidade. Não adianta cursinho de fim-de-semana, não adianta ter o título sem que este título efetivamente não transforme a prática cotidiana deste professor.

Em vários casos, o Ideb das capitais costuma ser menor que o de outras cidades de menor porte. Que mensagem isto traz para os administradores?

Nós criamos um grupo das grandes cidades exatamente por saber que a realidade delas é muito complexa e também é muito desafiadora, porque há maior diversidade de problemas. Existem grandes cidades que têm área rural, comunidades indígenas, que têm educação de jovens e adultos, ou que possuem todas estas diversidades reunidas. É mesmo um desafio lidar com os bolsões de pobreza, com a exclusão de setores que sempre foram excluídos do acesso a direitos básicos da população e isso reflete na educação. Trabalhamos em regime de colaboração com os gestores das grandes cidades para ajudá-los neste trabalho desafiador.

A universalização do ensino fundamental é uma realidade no país. Isso acontece por que a sociedade está consciente da importância da educação ou isso se deve, em parte, aos programas sociais?

Porque é um direito público, subjetivo e explícito da Constituição Federal. Não dá mais para conceber a criança fora da escola porque isso é uma desobediência constitucional e isto está cada vez mais claro tanto na sociedade quanto nos diferentes orgãos do governo. Para isso, temos políticas públicas como a bolsa-família, por exemplo, que é uma política para garantir a permanência dessas crianças nas escolas. E é importante lembrar que a Emenda Constitucional 59, aprovada no final de outubro, no Congresso Nacional, estabelece que a partir de 2016 a matrícula obrigatória no Brasil será para crianças entre 4 e 17 anos de idade. Nós teremos um avanço na questão da garantia de direitos muito grande e temos de nos planejar com os sistemas estaduais e municipais para fazer valer este novo direito.

O que é preciso fazer, desde já, para que, a partir desse prazo, seja possível universalizar a matrícula para esta faixa etária?

Nós já nos unimos com os representantes dos professores e secretários estaduais e municipais e o primeiro passo é um diagnóstico muito preciso da demanda de cada cidade, porque existem cidades que já universalizaram a pré-escola e cidades que ainda precisam construir muitas escolas infantis. Então, pedimos a eles que fossem elaborados diagnósticos de cidade por cidade, pois o que temos, até agora, é um panorama nacional. Ainda temos 25% de crianças de 4,5 anos fora da escola e esses 25% não são iguais em todo o país. O primeiro passo é um diagnóstico, o segundo é uma adequação da legislação. Estamos também planejando como será a relação e o investimento do Ministério nesses 5 anos que teremos, de 2010 a 2015, para que, em 2016, todos os estados e municípios já estejam com a matrícula obrigatória de 4 a 17 anos funcionando, sem atropelos.

As escolas de excelência poderiam se tornar um modelo de referência para as demais do país?

Este tipo de escola tem uma realidade muito diferenciada em relação a outras escolas estaduais e municipais. É importante que a gente aprenda com elas, mas é importante também que as pessoas se lembrem que, por exemplo, as condições de trabalho dos professores das escolas federais são muito melhores e diferentes das que existem nas redes estaduais e municipais. A outra questão, que é um diferenciador grande, é o fato de os colégios de aplicação estarem dentro das universidades e serem o espaço da aplicação das novas pesquisas e o que há de ponta em educação. É importante darmos visibilidade para essas experiências, proporcionar momentos de troca, mas sabemos que ainda é muito difícil que a forma de se organizar e de se estruturar das escolas federais seja estendida às outras 180 mil escolas brasileiras.

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